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A Neuropsicologia e o comportamento desviante

avaliação da organização cerebral dos processos mentais humanos.

Evidências da investigação para uma localização cerebral do comportamento emocional e social

Debruçaremos a nossa análise deste tópico a partir de um conjunto de estudos em animais e humanos que procuram demonstrar uma relação directa entre a acção de diversos sistemas estruturais cerebrais e a regulação do comportamento emocional e social.

Myers realizou um conjunto de estudos em macacos Rhesus a partir da manipulação cirúrgica de várias áreas cerebrais, tradicionalmente apontadas como estando implicadas em alguma forma de controlo do comportamento social, a saber, lobos pré-frontais, pólos temporais anteriores e córtex do giro cingulado. Segundo o autor, o motivo da escolha desta espécie de macacos deveu-se ao facto de estes animais organizarem-se em hierarquias sociais altamente estruturadas, e desta forma o seu estudo permitir uma melhor compreensão da neurologia do comportamento social, permitindo também uma melhor compreensão da determinação da base neural da socialização nos humanos.

A metodologia consistiu em, a partir de uma população de macacos Rhesus em vida livre numa reserva florestal, ser avaliado e quantificado exaustivamente o comportamento de macacos claramente identificados como os que seriam posteriormente intervencionados cirurgicamente. Depois de se ter estabelecido uma linha de base quanto ao padrão comportamental de cada indivíduo na hierarquia social do seu grupo, procedeu-se à randomização dos indivíduos em três grupos distintos em que se induziria: a) excisão dos lobos pré-frontais, bilaterais; b) excisão dos pólos temporais anteriores, bilaterias; c) excisão do córtex do giro cingulado, bilateral.

De acordo com a equipa de investigadores liderada por Myers, os macacos com lesões iatrogénicas do córtex cingulado, quando recolocados no seu habitat não apresentaram alterações de monta no seu comportamento individual e social; o mesmo aconteceu com os sujeitos a quem se produziu lesões em outras áreas corticais e que serviram de controlo. Todavia, os sujeitos aos quais foram induzidas lesões dos pólos temporais anteriores e dos lobos pré-frontais, quando libertados no seu habitat natural falharam claramente na sua reaproximação ao grupo social de pertença: falha em retornar ao grupo social e manter-se como parte integrante de uma família, isolamento dos demais, falta de iniciativa para participar em actividades grupais, etc. Myers et al. Concluíram então que, “As lesões puseram de parte os profundos instintos que levam os macacos rhesus a formar grupos sociais” (p 162).

Apesar da clara evidência demonstrada pelo seu estudo, Myers et al. chamam à atenção para uma clara limitação do mesmo: os macacos viviam num ambiente livre, onde a avaliação pormenorizada e exaustiva de cada padrão comportamental não se poderia fazer com tanto rigor quanto em experiências laboratoriais. Desta feita, levou a cabo um segundo grupo de estudos, partindo do mesmo princípio anterior. Para tal utilizou pequenos grupos sociais de macacos Rhesus (6 a 12 indivíduos) que eram mantidos em grandes jaulas (Frantzen and Myers, 1973). Depois de terem sido produzidas as lesões cerebrais os indivíduos eram forçados a manter-se nas mesmas jaulas onde estava o seu grupo social de origem. Novamente, foram produzidas lesões dos lobos pré-frontais, pólos temporais anteriores e córtex cingulado. O comportamento destes animais, foi estudado anterior e posteriormente às lesões iatrogénicas.

Neste estudo, as lesões dos lobos pré-frontais produziram as alterações mais marcadas. Segundo os autores as alterações em termos do carácter foram globais e afectaram cada um dos aspectos do comportamento social e emocional. Por exemplo, fêmeas adultas que antes cuidavam das suas crias perderam completamente a iniciativa para comportamentos solícitos e de protecção das mesmas (deixaram de defender as suas crias das ameaças ou mesmo agressões por parte de outros animais ou humanos). Em lugar disso, estas fêmeas permitiam que as suas crias deambulassem pela jaula, naquilo a que os autores do estudo chamaram de atitude de vocalização “I am lost” (NT: “estou perdido”). Apesar de as crias continuarem a conseguir alimentar-se através da amamentação em intervalos mais ou menos regulares, todas as iniciativas de contacto físico era iniciado pelas crias. O comportamento materno de embalar e cuidar da cria (catar, lamber, etc.) durante a amamentação também desapareceu. Para além destes contactos infrequentes, a protecção das crias passou a ficar a cargo de outros animais (em dois dos casos, o macho dominante).

Ainda em referência a este estudo, os animais operados aos lobos pré-frontais mostraram deficiências no seu comportamento social num número muito mais extenso de aspectos: verificou-se a perca virtual de qualquer expressão facial e vocalizações, que detêm um papel importante na socialização desta espécie (tornando o animal num ser “estranhamente mudo e poker-faced”); redução clara de repertório comportamental; perca de níveis de dominância hierárquica (até os animais em níveis mais baixos na cadeia hierárquica passaram a poder ter ascendente sobre os animais com lesão do córtex pré-frontal). Como consequência de tais alterações estes animais passaram a ser alvos de agressões frequentes por parte dos outros animais do seu grupo social, sendo facilmente subjugados ou afugentados pelos mesmos.

Segundo Myers a proximidade criada entre dois animais num determinado grupo está fortemente relacionada com a sua relação de co-sanguinidade. Da mesma forma, durante a época de acasalamento, os níveis de proximidade e afastamento entre os machos e as fêmeas adultas nesta espécie específica estão fortemente afectados pelas relações com o companheiro (o correspondente à relação conjugal nos humanos). Novamente, no estudo em questão (Frantzen & Myers, 1973), os níveis de proximidade dos indivíduos com excisão do córtex pré-frontal, alterou-se consideravelmente. No período imediato ao seu retorno à jaula, estes indivíduos eram frequentemente abordados pelos outros animais do seu grupo social. Todavia, pouco tempo depois, todos os animais, incluindo os membros da sua própria família deixaram de se relacionar com os animais lesionados. Com última conclusão deste estudo, os autores referem que os fortes laços que se formaram durante o relacionamento anterior às lesões falharam em manter-se, e em outros aspectos, os animais lesionados (fêmeas) apresentaram respostas sexuais inadequadas.

Para abordarmos a localização cerebral das dimensões emocionais em humanos debruçar-nos-emos numa série de artigos diferenciados.

Obrador et al. estudaram as áreas cerebrais emocionais através da estimulação programada de determinadas áreas com um objectivo terapêutico. Como conclusões dos seus estudos, estes autores