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Avaliação neuropsicológica. Funções verbais e funções executivas

posterior do gyrus temporal superior – áreas 22, 37, 39 e 40 de Brodmann), responsável pela análise e identificação dos estímulos linguísticos sensoriais (Pereira, Reis & Magalhães, 2003). A linguagem foi a primeira função cognitiva a ser correlacionada com processos patológicos que afetavam áreas específicas do cérebro.

2.2. Pressupostos da avaliação neuropsicológica da linguagem

A avaliação neuropsicológica da linguagem, tal como aludem Bartolomé, Fernández e Ajamil (2001), debruça-se sobre: a expressão oral (e.g. conversar, repetir palavras, sequências automáticas, ritmo, linguagem narrativa); a compreensão oral (e.g. audição fonémica, compreender as palavras, compreender frases simples e complexas, compreender estruturas lógico-gramaticais); a expressão escrita (e.g. reproduzir em papel letras, números, palavras e frases, cópias, elaborar frases, escrita narrativa); e a compreensão escrita (e.g. discriminar símbolos e palavras, associação fonética, ler frases e parágrafos). Ainda de acordo com estes autores, as principais alterações da linguagem podem surgir em dois tipos diferentes, nomeadamente as alterações que ocorrem antes ou durante a aquisição da linguagem e as alterações que ocorrem depois de já ter sido adquirida a linguagem.

Por sua vez, Holland, Hogg e Farmer (1997, cit in Johnstone, Holland & Larimore, 2000) apontam como objeto de avaliação neuropsicológica nas competências linguísticas: a linguagem expressiva (semântica, sintaxe, pragmática, discurso e linguagem escrita); e a linguagem recetiva (compreensão da leitura e compreensão auditiva). As formas básicas de disfunção linguística são, tal como indicam Johnstone, Holland e Larimore (2000), a afasia de Broca, a afasia de Wernicke, a afasia motora transcortical, a afasia sensorial transcortical, a afasia de condução e a afasia global. Esta afirmação pressupõe que as afasias, que consistem na perda ou alteração da linguagem por consequência de um dano cerebral, constituem as principais alterações da linguagem, bem como a disartria e apraxias do discurso (Barroso, 2001; Lezak et al, 2004). Perante Caplan (1998), resultados de diversos estudos demonstram um conjunto de sintomas afásicos no seguimento de lesões no tálamo, cápsula interna, putamen, caudado e estruturas de substância branca envolventes.

Neste sentido, a afasia é uma perturbação de linguagem, adquirida e de etiologia neurológica, que não pode ser explicada pela presença de perturbações ao nível sensorial, cognitivo ou motor, não havendo qualquer dificuldade do indivíduo na programação ou execução dos movimentos de articulação oral (Hallowell & Chapey, 2008, cit in Santos, 2013). No que diz respeito à taxonomia das afasias, pode encontrar-se a divisão em dois grupos, nomeadamente o das afasias típicas (originadas por lesões a nível cortical no hemisfério esquerdo) e o das afasias atípicas (originadas por lesões no hemisfério direito – cruzadas, ou a nível subcortical do hemisfério esquerdo – subcorticais).

Dentro da tipologia, e além das afasias mencionadas no parágrafo anterior, surgem a afasia transcortical mista e a afasia anómica (Castro-Caldas, 2000, cit in Santos, 2013). Ardila (2010) propõe uma classificação das afasias em primárias (afasia de Wernicke e afasia de Broca), secundárias (afasia de condução) e disexecutivas (afasias transcorticais).

Com base no modelo Wernicke-Lichtheim pode definir-se: a afasia de Broca enquanto perturbação na expressão resultante de lesão no centro motor da linguagem – incapacidade de expressar linguagem; a afasia de Wernicke enquanto perturbação na compreensão resultante de lesão no centro sensorial – incapacidade de perceber linguagem; a afasia de condução como perturbação resultante de lesão no fascículo arqueado, o trato que une estes dois centros – dificuldade na repetição do discurso; a afasia transcortical motora quando a lesão abrange os centros motor e conceptual – incapacidade de expressar mas repetição preservada; a afasia transcortical sensorial quando a lesão abrange os centros sensorial e conceptual – incapacidade de compreender mas repetição preservada; a afasia global, quando as lesões são extensas afetando todos os centros; e a afasia anómica, sem ligação com lesão numa área específica – dificuldade em encontrar palavras/nomes (Kertesz, Sheppard & MacKenzie, 1982; Yourganov, Smith, Fridriksson & Rorden, 2015).

2.3. Principal patologia que afeta a linguagem

Uma das patologias mais comummente associadas ao surgimento de disfunção na linguagem é o acidente vascular cerebral (AVC), sendo a disfunção mais frequente a afasia (Otal, Olma, Flöel & Wellwood, 2015; Plowman, Hentz & Ellis, 2012; Yourganov, Smith, Fridriksson & Rorden, 2015). Tal como mencionado no Programa Harvard Medical School Portugal (2012), o AVC é uma lesão cerebral resultante da interrupção do fornecimento de sangue ao cérebro, podendo ser classificado em hemorrágico ou isquémico, de acordo com o tipo de interrupção (por rebentamento de um vaso sanguíneo vs. pelo tamponamento de um vaso sanguíneo).

Neste sentido, e de acordo com a literatura, a afasia está patente em situações de incapacidade severa ao nível da fraqueza dos membros, perda de funções e perda de QI, bem como de um menor grau de recuperação das atividades sociais (Wade, Hewer, David & Enderby, 1986). Quanto ao prognóstico da afasia pós-AVC, são tidas em conta algumas variáveis, nomeadamente o momento em que surgiu a afasia e respetiva severidade, e a localização e tamanho da lesão (Plowman, Hentz & Ellis, 2012).

2.4. Instrumentos de avaliação neuropsicológica das afasias

Quanto à avaliação específica das afasias, Goodglass (1986) e Stringer (1996), citados por Lezak et al (2004), aludem para questões comummente presentes nos testes que são realizados ao paciente, nomeadamente o pedido para nomear objetos simples, reconhecer palavras simples faladas, agir de acordo com ordens em série, repetir palavras e frases, reconhecer letras, números, palavras e símbolos simples escritos/impressos, fornecer respostas verbais e gestuais a questões simples escritas/impressas e escrever letras, números, palavras, entre outros. Alguns testes podem inclusivamente conter um pedido para o paciente contar uma história, por exemplo.